O mundo desperta-se para a importância da educação
infantil. No Brasil, a prioridade governamental dada ao ensino fundamental, tornando-o universal,
deixou a educação infantil em plano inferior. Hoje, percebe-se a necessidade de
estender essa prioridade também à educação infantil.
Sob o prisma da aprendizagem, a educação infantil é suporte
essencial. Os primeiros seis anos da vida são decisivos para desenvolver
habilidades lógicas, musicais, emocionais, motoras e de convívio social. A
educação infantil é determinante na aprendizagem. Sua ausência tem sido
apontada como a grande responsável pela maioria das repetências, assinalada no
ensino fundamental, acarretando ao governo um gasto bem maior do que se
mantivesse educação infantil para todos.
A falta de atenção à primeira infância provoca malefícios
que se refletem em toda a vida escolar do aluno, quando não em abandono da
escola, pela dificuldade em acompanhar o ensino. Deixa o ser humano em
defasagem para o resto da vida, causa prejuízo à sua vida social, profissional
e, conseqüentemente, à vida do País.
Enquanto não se construir uma rede de assistência integral à
infância, continuaremos a viver a desordem social. Após a promulgação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que colocou a educação infantil como a
primeira etapa da educação básica, começaram a surgir propostas para a reforma
da educação, parecendo tomar vulto a que propõe a criação, em uma mesma
comunidade, de unidades educacionais, oferecendo
vagas a todas as crianças, desde o ano
“zero” e mantendo um ensino de qualidade em todos os graus da educação básica:
da creche ao ensino médio.
A educação infantil, tendo deixado de ser prioridade, mostra o quanto
a nossa educação falhou nos últimos anos. Ela era vista, apenas, como algo a
mais e isso refletiu nas desigualdades educacionais e na pouca consideração que
o professor desse grau de ensino passou a ter. Quanto mais baixa a série que
lecionava, menos prestígio tinha.
O Censo do MEC revelou, no início da implantação da reforma,
a existência de uma educação infantil de
baixa qualidade, com a maioria dos professores sem habilitação para lecionar. Preocupado
com a situação, o MEC lançou
referenciais para a formação dos professores de
creche e pré-escola, lançou os
“Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação Infantil”, na proposição de
orientar o trabalho desse nível de ensino. Forneceu diretrizes para o
credenciamento das escolas, com especificações a espaço, a recursos pedagógicos
e outros.
A baixa qualidade da educação infantil confunde
desenvolvimento infantil com sobrecargas de atividades pedagógicas e
alfabetização precoce. Ela ainda é grandemente constituída por professores que
não entendem a essência desse nível de ensino, que consiste em desenvolver
habilidades, atitudes no tempo próprio da criança, no seu ritmo próprio,
obedecendo as fases do seu desenvolvimento mental. Alunos há que requerem mais
tempo para adquirir determinados conceitos e técnicas.
Os alunos aprendem mais e mais rapidamente quando o
professor é um orientador sereno da aprendizagem, um comandante firme,
afetivo. Hoje, em plena era digital, a
falta de conhecimento significa exclusão social e o Censo de 2001 nos mostrou
que mais de dois milhões de crianças estão distantes dos livros, dos cadernos e
os que estão em salas de aula recebem um ensino sem qualidade.
Estudos
pertinentes citam graves
conseqüências da ausência da
educação infantil. Referem-se a gastos humanos, sociais e
políticos. Humanos, quando o aluno desprovido da educação infantil não alcança
um ensino de nível. Perde a auto-estima, torna-se propenso à derrota. Sociais,
quando despreparado, torna-se um freguês dos programas de renda mínima, cestas
básicas, Febem. Político, quando o analfabetismo escolar leva ao analfabetismo
político.
Descobriu-se que a educação infantil tem papel fundamental no
desenvolvimento do comportamento social. Ela é vista não só como alicerce do
desenvolvimento cognitivo, mas como alicerce da formação da personalidade, do
caráter, da religiosidade. Formar a criança é prevenir o futuro. Dar-lhe
valores morais, éticos, é preparar um futuro de paz, sem violência, formar uma
sociedade melhor estruturada. Ademais, a criança, segundo recentes estudos, é o
agente transformador da sociedade mais eficaz que se tem. O que ela aprende na
escola leva à sua família, à sua comunidade, à sua cultura. A criança é um educador
social de importância.
“Educa-se a criança para não chorar o adulto”. Essa verdade
vem impregnando o entendimento educacional, tomando vulto na sociedade.
Projetos comunitários voltados à recreação de crianças de favelas, candidatas à
criminalidade, cresceram e são mostrados, pelos meios de comunicação, como
exemplos a serem seguidos. Entidades, organizações, artistas, voluntários, abraçam
a causa das crianças sem escolas, sem rumo, e vão aos locais de suas moradias
ensinar-lhes dança, música, teatro, jogos esportivos, dar sentido às suas
vidas.
Esses movimentos, em prol das crianças de rua, sensibilizam,
deixam claro de que a maioria das crianças de favelas não tem futuro e se perde
na promiscuidade. Essas crianças serão os bandidos de amanhã, bandidos a
invadir as nossas casas, a matar, a roubar, e nós seremos os maiores atingidos.
Então, se não formos tocados pelo triste espetáculo do abandono, que se
descortina, que sejamos, ao menos, precavidos a nosso favor. Atender às
crianças desamparadas é benefício que faremos a nós, às nossas famílias, à
sociedade.
Um outro aspecto da função da escola é a passagem dos
valores morais. A pedagogia nos ensina que justiça, solidariedade, tolerância,
obediência às regras, respeito ao limite, são valores que se aprendem, como
também se aprendem os antivalores: injustiça, crueldade, preconceito, egoísmo,
desrespeito. A escola de educação infantil, especialmente, deve primar-se por
formar moralmente as crianças. É nessa faixa de idade que se constrói o
alicerce. Ultrapassada a fronteira da infância, em torno dos 12 ou 13 anos,
fase da adolescência, a mudança de personalidade torna-se difícil.
Já começa haver a percepção da necessidade de se adequar
políticas educacionais à realidade vivida pelas populações carentes. A percepção
de que investir na primeira infância sai bem mais em conta que manter uma
Febem. A percepção maior de que investir em oportunidades às crianças e aos
jovens, dando-lhes vida decente,
garante o exercício da cidadania e leva a menos criminalidade. É como dizia Victor
Hugo, já no século XIX: “Abre-se uma escola, fecha-se uma cadeia”
Chega-se, finalmente, à conclusão de que o mundo
de paz depende de como a nação, a sociedade, vierem a tratar as suas crianças,
de como investirão em planos de apoio às famílias carentes
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